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Julho 4, 2025

ADN antigo fornece um novo meio para explorar as dietas humanas durante o Império Romano.

Equipa multidisciplinar liderada por investigadores CIIMAR consegue, pela primeira vez, extrair e sequenciar ADN antigo encontrado na fábrica de salga da vila Romana de Adro Vello, em Espanha.

Equipa multidisciplinar liderada por investigadores CIIMAR consegue, pela primeira vez, extrair e sequenciar ADN antigo encontrado na fábrica de salga da vila Romana de Adro Vello, em Espanha, permitindo vislumbrar as dietas humanas baseadas em peixe durante o Império Romano. O estudo, agora publicado na revista Antiquity, mostra que os tanques de salga locais utilizados para fermentar o peixe em pastas e molhos populares em todo o Império Romano usavam predominantemente sardinhas europeias como principal ingrediente.

Esta descoberta foi possível porque a  equipa que integrou os investigadores Paula F. Campos e Gonçalo Themudo, aplicaram métodos de DNA antigo que consegue identificar restos de animais quando estes já estão danificados de forma irreconhecível.

O peixe era uma fonte vital de proteínas para os romanos e era frequentemente conservado através da salga e da fermentação, para produção de pastas e molhos de peixe. O mais famoso era o garum – um molho popular como tempero e condimento com sabor a umami. O garum era preparado tanto para consumo local como para ser comercializado a longas distâncias, sendo que o seu longo prazo de validade facilitava o comércio em todo o império. Assim, foram construídas fábricas de salga de peixe em grande escala, conhecidas como cetariae, nas zonas costeiras, particularmente nas costas atlânticas da Hispânia (atual Península Ibérica) e de Tingitana (atual Marrocos), que eram famosas pelos seus molhos de peixe.

 

ADN degradado pelo processamento

Devido à fragilidade dos restos de peixe, estes são frequentemente encontrados danificados, não sendo identificáveis apenas por observação. “As espinhas de peixe são um achado frequente no registo arqueológico do período romano, mas a sua utilização em estudos arqueogenómicos é residual, provavelmente devido à natureza fragmentária dos restos, que dificulta a identificação da espécie ou mesmo do género”, afirma Paula F. Campos, líder do estudo “Roman Atlantic garum: DNA confirms sardine use and population continuity in north-western Iberia”. Isto é especialmente verdade para os que provêm de tanques de salga, uma vez que foram intencionalmente esmagados durante a produção do molho.

Para conhecer mais sobre as espécies utilizadas nas dietas Romanas para a confeção de alimentos como o garum, é necessário recorrer a análise ADN antigo. No entanto este é um processo difícil: as principais técnicas utilizadas para fazer este tipo de análise não são suficientes uma vez que, no caso das pastas e molhos de peixe, os processos de trituração e fermentação aceleram a degradação do ADN.

 

Extrair DNA degradado

Foi neste contexto que esta equipa multidisciplinar aplicou as mais avançadas metodologias de biologia molecular para, pela primeira vez, extrair e analisar o ADN de vestígios de peixe das cubas romanas de fermentação de peixe na fábrica de salga do sítio arqueológico da vila Romana de Adro Vello, no Grove, Espanha. Este importante sítio arqueológico é o foco de um projeto multidisciplinar financiado pela Xunta de Galicia e dirigido pelo Departamento de Arqueologia da Universidade de Vigo.

Principal Ingrediente: a sardinha

Os principais resultados deste trabalho estão agora publicados na revista científica internacional Antiquity e mostraram que o novo método foi eficaz na identificação das espécies correspondentes aos vestígios encontrados na fábrica de salga do sítio arqueológico da vila Romana de Adro Vello. Mais ainda, através da comparação as sequências de ADN dos vestígios arqueológicos com as espécies atuais, foi possível perceber que as cubas da fábrica de salga de Adro Vello serviram para salgar sardinhas da época romana e que estas estão estreitamente relacionadas com as que se encontram atualmente na mesma zona, confirmando a continuidade genética apesar da elevada mobilidade da espécie.

De um modo geral, estes resultados confirmam o valor dos estudos de ADN antigo para a identificação de restos de animais que foram danificados ao longo do tempo: “neste estudo, demonstramos que o DNA utilizável pode sobreviver em ambientes de fermentação, como as salmouras usadas pelos romanos para fazer garum”, conclui Paula Campos. “Apesar de suportar condições que promovem a degradação do ADN, os métodos que descrevemos permitem a identificaçãoo de espécies a partir destes ossos processados”. Esta nova metodologia permitirá o estudo de restos arqueológicos noutras cubas de salga de outras regiões, possibilitando conhecer que outras espécies eram usadas para o garum e outros molhos. Além disso tem implicações significativas para outro tipo de estudos arqueológicos de peixes no futuro permitindo compreender não só a evolução destas espécies, mas também a história da sua ligação ao ser humano.

Além dos investigadores do CIIMAR, participaram neste estudo investigadores da Universidade de Vigo e da Universidade de Léon, em Espanha, e da Universidade de Copenhaga, na Dinamarca. Esta investigação foi financiada através de fundos nacionais da Fundação para a Ciência e a Tecnologia e de Fundos de Desenvolvimento Regional Europeu, no âmbito do Programa PT2020.

 

Consulte o comunicado de imprensa aqui.