Estudo de investigadores do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR) e da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) analisa o potencial e viabilidade de um parque de conversores de energia das ondas ao largo de Esposende, com o duplo intuito de produzir eletricidade a partir de fontes renováveis e fomentar a proteção costeira por intermédio da atenuação da agitação marítima local.
O estudo “Assessment of electricity production and coastal protection of a nearshore 500 MW wave farm in the north-western Portuguese coast” agora publicado na revista científica internacional Applied Energy da Elsevier foi desenvolvido pelos investigadores do grupo de Energia Marinha e Estruturas Hidráulicas do CIIMAR e pretende trazer uma nova visão sobre os parques de energia das ondas ao aliá-los às necessidades de proteção costeira.
O aproveitamento da energia das ondas contribui para a transição energética “verde” para a qual temos vindo a caminhar nas últimas décadas. No entanto, uma exploração comercialmente viável deste abundante recurso energético renovável implica grandes parques de energia das ondas, o que pode gerar conflitos com outras atividades associadas às zonas costeiras. Mas nem sempre tem de ser assim. O estudo em questão indica que não tem de haver competição entre a introdução de soluções de energia das ondas e o funcionamento da zona costeira (como o turismo, pesca e ou as reservas de conservação), sugerindo que o aproveitamento de energia pode ter aplicações complementares, como é o caso de mecanismos para proteção costeira. Em concreto, o estudo aborda uma proposta exploratória para um parque multi-funcional de conversores de energia das ondas (CEOs) para a região de Esposende que além de produzir energia, pode contribuir ativamente para a proteção da costa.
Segundo Daniel Clemente, primeiro autor do artigo, a opção multifacetada é uma aplicação muito eficiente das tecnologias: “se podemos proteger a nossa costa e gerar energia renovável ao mesmo tempo, porque não explorar? Precisamos de soluções disruptivas para estas duas temáticas, mas sem descuidar a minimização de eventuais conflitos com outros usos do espaço marítimo” explica. Francisco Taveira Pinto, líder do grupo de Energia Marinha e Estruturas Hidráulicas reforça a ideia: “o estudo ilustra a importância da multifuncionalidade do aproveitamento da energia das ondas.”
A produção de energia verde
Estima-se que as duas estruturas com melhor desempenho nesta proposta de parque de aproveitamento de energia das ondas (“W” a 280° e alinhada “III” a 295° dos parques CEOs) poderiam produzir anualmente de até 341 353 GWh/ano e 316 351 GWh/ano, respetivamente. Se considerarmos que o consumo médio de eletricidade per capita em Esposende é de cerca de 3 215 kWh em 2022, a melhor configuração poderia satisfazer as necessidades anuais de mais de 100 000 habitantes.
A proteção costeira
A linha de costa portuguesa está bastante exposta à agitação marítima, com níveis energéticos elevados, o que suscita desafios que vão desde a construção de estruturas de proteção ao estudo das interações hidrodinâmicas com as linhas de costa como a erosão e inundações. Este estudo permitiu conhecer o impacto local do parque proposto, no que diz respeito ao nível da redução da intensidade da agitação marítima, numa vasta área a sotavento desta localização, por absorção de energia pelos CEOs. O impacto foi particularmente notório ao nível da altura das ondas e da energia inerente, com atenuação significativa com a aproximação da linha de costa. As reduções da altura das ondas foram, em alguns casos, superiores a 25%.
Ao invés de seguir uma lógica mais tradicional de implementação de soluções “pesadas” de engenharia, este estudo permite-nos aproveitar a energia disponível. Paulo Rosa Santos co-líder do mesmo grupo do CIIMAR fala-nos da pertinência desta solução inovadora: “É imperioso encontrar e demonstrar a eficácia de soluções inovadoras e disruptivas para os tradicionais problemas das zonas costeiras. Este estudo mostra que é possível proteger a costa das ações do ambiente marítimo e, simultaneamente, produzir eletricidade limpa, suportando assim a transição e a autossuficiência energéticas de Portugal.”
Um país energeticamente verde
Em 2023, mais de 60 % da eletricidade de Portugal continental proveio de fontes de energia renováveis, principalmente energia hidroelétrica, eólica e solar. Ao incorporar a energia das ondas, Portugal poderia tornar-se virtualmente autossuficiente ou mesmo exportador de eletricidade, marcos fundamentais para as estratégias nacionais e europeias de transição energética “verde” e de autonomia. Esta energia poderia também alimentar outros utilizadores e mercados de nicho, como a aquacultura offshore e a dessalinização, ambos de elevado potencial nacional.
O futuro
O estudo em questão permitiu, de uma forma realista e abrangente, transformar um problema – erosão costeira ao largo de Esposende – numa oportunidade multi-funcional de produção de energia marinha renovável e proteção costeira, que pode não só servir a população local afeta ao caso de estudo, mas providenciar um ponto de partida para outros trabalhos ao largo da costa Portuguesa. O contacto com as comunidades locais e as partes interessadas será fundamental para uma proposta viável, aprovada e melhorada, a fim de garantir uma solução sólida que beneficie todas as partes interessadas, satisfazendo simultaneamente as necessidades energéticas e preservando o ambiente e a paisagem. Segundo Daniel Clemente, “em etapas futuras, será importante consolidar mais este aspeto desafiador com as comunidades e instituições locais, caso haja interesse em explorar a proposta do estudo”, uma meta que fica em aberto para este e outros possíveis parques ao longo da costa Portuguesa.
Consulte aqui o Comunicado de Imprensa.
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