As cianobactérias são bactérias fotossintéticas que se encontram em quase todos os habitats terrestres e aquáticos e que são conhecidas por produzirem valiosos metabolitos secundários. Estes compostos, muitas vezes referidos como produtos naturais, possuem propriedades relevantes para a biotecnologia industrial, cosmética e farmacêutica. Os metabolitos secundários são codificados por grupos de genes biossintéticos. No entanto, cerca de 80-90% destes clusters não são expressos em condições laboratoriais padrão, um ambiente artificial que apresenta pouca dificuldade ou competição. Como consequência, o crescimento individual de microrganismos num ambiente de laboratório pode revelar apenas uma pequena fração do espaço metabólico encontrado na natureza. Investigar as interações microbianas através de uma perspetiva ecológica é, portanto, uma abordagem particularmente frutífera para desvendar uma nova química e bioatividade.

Apesar das cianobactérias e protozoários coexistirem em ambientes aquáticos, as interações entre estes organismos são pouco conhecidas. As amebas são organismos unicelulares que se distribuem de forma ubíqua no meio ambiente e são reconhecidas como grazers.
Vários estudos reportaram que diferentes estirpes de cianobactérias apresentam diferentes suscetibilidades ao grazing: enquanto algumas cianobactérias podem escapar á predação após serem ingeridas, outras são consumidas por estes organismos eucarióticos. Alguns estudos mostraram que a morfologia das cianobactérias ou as proteínas de superfície podem afectar o grazing de amebas. Noutros estudos, foi levantada a hipótese de que as diferentes suscetibilidades das cianobactérias ao grazing são provavelmente o resultado da libertação de produtos naturais ainda desconhecidos, ou seja, apoiando uma defesa quimicamente mediada contra o grazing por parte destes organismos. A conhecida cianotoxina microcistina mostrou não ser eficaz contra a predação de protozoários, uma vez que esses organismos eucarióticos se alimentam de estirpes de cianobactérias que produzem a toxina e a forma pura da mesma não tem efeito sobre as amebas.
Uma vez que se sabe que existe interação entre cianobactérias e amebas, mas os metabolitos envolvidos nesta interação são desconhecidos, o objetivo deste estudo é descobrir novas interações químicas entre estes organismos mediadas por pequenas moléculas, as quais pretendemos caracterizar. Para tal, diversas estirpes de cianobactérias vão ser testadas contra o grazing de diferentes estirpes de amebas, utilizando diferentes metodologias. As estirpes que apresentarem resistência ao grazing serão selecionadas para crescimento em pequena e scala na presença e ausência de amebas para posterior extração orgânica do meio de cultura e das células cianobacterianas. Os extratos brutos de cianobactérias que apresentarem bioatividade contra as amebas serão posteriormente cultivados em larga escala para isolamento e elucidação da estrutura dos compostos responsáveis pela actividade observada, utilizando diferentes técnicas cromatográficas. Por fim, o perfil de bioatividade dos metabolitos puros que estão envolvidos na interação entre cianobactérias e amebas será examinado em ensaios ecologicamente e farmacologicamente relevantes.
Prevê-se que no tempo esperado para a execução deste projeto, um metabolito que confere resistência ao grazing de amebas será identificado e caracterizado neste projeto, gerando maior conhecimento a respeito da ecologia química das cianobactérias e da ecologia aquática em geral e, também promovendo uma nova metodologia para descoberta de novos NPs. Neste projeto a potencial atividade destes compostos vai ser testada contra outros protozoários responsáveis por doenças animais e humanas importantes, como Leishmania e Plasmodium, uma colaboração recentemente iniciada com a investigadora principal do grupo de investigação de doenças parasitárias do i3s. Uma vez que são poucos os medicamentos disponíveis para estas doenças, a nossa proposta de investigação
pode também contribuir para enfrentar esta importante questão farmacológica.
Para resumir, CYAmoeba irá explorar um recurso biológico único (LEGEcc) para se concentrar nas interações pouco exploradas entre cianobactérias e amebas. As estratégias ecológicas e bioquímicas associadas a estas interações serão reveladas e vão guiar a descoberta de novos PNs e atividades biológicas associadas.